segunda-feira, 4 de abril de 2011

Lealdade


Em 1864, em Edinburgh, Escócia, vivia um velho homem chamado Jock.
Durante toda a sua vida ele tinha sido um fiel pastor de ovelhas,
enfrentando bravamente perigos e intempéries para defender o seu rebanho.
Com quase setenta anos, ele ainda conservava o coração e a habilidade de um
pastor, mas não a saúde necessária. Suas pernas já não podiam escalar as
pedras para resgatar uma ovelha ou para espantar um predador. E, embora a
família para quem trabalhava gostasse muito dele, as finanças iam mal e não
podiam conservá-lo. Assim, mancando por fora e magoado por dentro, lá se
foi ele de trem, deixando sua terra natal rumo a um novo lar na cidade.

Jock fazia um pouco de tudo e ganhou muitos amigos naquela cidade de
mercadores. Eles gostavam do velho Jock pelo seu sorriso simpático, e por
suas habilidades nos mais variados trabalhos. Mas, apesar de tantos amigos,
sua família se constituía apenas dele e de um cachorrinho Fox Terrier que
ele adotou com o nome de Bobby.

Jock e Bobby eram inseparáveis e estavam sempre juntos na rotina de
passar pelas lojas em busca de serviços. Todos os dias eles começavam pelo
restaurante local, onde recebiam o que comer em troca de serviços de Jock.
Depois continuavam de porta em porta até que finalmente, à noite, os dois
voltavam para um porão que lhes servia de morada.

Dizem que muitas pessoas pressentem quando o tempo de morrer está
próximo. Foi assim com Jock. Já havia passado quase um ano desde que
chegara à cidade. Agora, era pleno verão e as colinas estavam em flor. Um
dia, ao amanhecer, ao invés de levantar, o velho Jock puxou sua cama até
perto da janelinha do quarto. E lá ficou, olhando as terras altas (os
Highlands) e distantes de sua amada Escócia.

- "Bobby", disse ele afagando o pêlo escuro e denso do cachorro, com a
mão que agora só tinha a força do amor, "é tempo de eu voltar para casa.
Eles não conseguirão me afastar de minha terra novamente. Sinto muito,
camarada, mas você vai ter de se cuidar sozinho daqui por diante."

Jock foi enterrado no dia seguinte em um lugar pouco comum para pobres.
Por causa do lugar onde morreu e da necessidade de ser enterrado
rapidamente, seus restos mortais foram colocados num dos cemitérios mais
nobres de Edinburgh, o cemitério Greyfriar. Entre os grandes e mais nobres
homens da Escócia, foi enterrado um homem comum e simples. Mas, é aqui que
nossa história começa.

Na manhã seguinte, o pequeno Bobby apareceu no mesmo restaurante que
ele e Jock visitavam a cada manhã. A seguir, ele fez a ronda das lojas,
como ele e Jock haviam sempre feito. Isto aconteceu dia após dia. Mas, à
noite, o cachorrinho desaparecia e somente reaparecia no restaurante no dia
seguinte.

Os amigos do velho Jock se perguntavam onde o cachorro ia dormir, até
que o mistério foi resolvido. Cada noite, Bobby não ia à procura de um
lugar quente para dormir, nem mesmo de um abrigo para protegê-lo do frio e
da chuva constantes da Escócia. Ele ia até o cemitério Greyfriar e tomava
posição ao lado de seu dono.

O vigia do cemitério tocava o cachorro cada vez que o via. Afinal,
existia uma ordem expressa, proibindo cachorros de entrarem em cemitérios.
O homem tentou consertar a cerca e até pôs armadilhas para caçar o
cachorro. Finalmente, com a ajuda do chefe de polícia, o pequeno Bobby foi
capturado e preso por não ter uma licença. E uma vez que ninguém podia se
apresentar como legítimo dono daquele cachorro, parecia que Bobby seria
morto.

Os amigos do velho Jock e de Bobby que souberam do caso foram até a
corte local a favor de Bobby. Finalmente, chegou o dia quando o caso deles
iria ser apresentado à alta corte de Edinburgh.

Seria quase um milagre salvar a vida de Bobby, sem mencionar o tornar
possível, para aquele cão fiel, poder ficar perto do túmulo de seu amigo.
Mas foi exatamente o que aconteceu, como um ato sem precedentes na história
da Escócia.

Antes que o juiz pudesse dar a sentença, uma horda de crianças entrou
na sala de audiência. Moeda por moeda, aquelas crianças conseguiram a
quantia necessária para a licença de Bobby.

O oficial da corte ficou tão impressionado pela afeição das crianças
pelo animal que concedeu a ele um título especial, tornando-o propriedade
da cidade, com uma coleira declarando este fato.

Bobby pôde então correr livremente, brincando com as crianças durante o
dia. Mas, a cada noite, durante catorze anos até que morreu em 1879, aquele
amigo leal manteve guarda silenciosa no cemitério de Greyfriar, bem ao lado
de seu dono. Se algum dia você for para Edinburgh, poderá ver a estátua de
Bobby naquele cemitério que ainda está lá, mais de 120 anos de sua morte.

Aquele cachorrinho de Edinburgh demonstra uma característica que
gostaríamos de encontrar em todos os seres humanos: a lealdade. A lealdade
que nos faz permanecer ao lado da cama de alguém doente, ouvir o problema
dos outros horas sem fim, dar uma ajuda extra até mesmo num sábado ou
feriado.

Esta incrível espécie de amor suave, é lealdade. Felizmente ela é
encontrada em algumas pessoas. A elas é dedicada esta história

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